Contabilidade: controle da Sustentabilidade e da Transparência – Por Carlos Barbosa

Especialista em Administração Financeira e Mestrado em Administração e Controladoria

*Coluna por Carlos Barbosa, 29/03/22

As Demonstrações Contábeis e Financeiras se propõem a refletir a situação de cada empresa dentro do cenário econômico de um país ou mesmo do mundo, considerando a tendência da universalização das normas Contábeis. Essas ferramentas alicerçam os empresários na condução das suas estratégias de otimização de desempenho para suportar suas expectativas, seja pelo resultado da movimentação Patrimonial (Contábil) ou pela movimentação do dinheiro (Financeiro). Adicionalmente, as Demonstrações reportadas pelas empresas são fundamentalmente úteis para atender as necessidades informativas dos investidores e credores. Mas a Contabilidade não se limita a informar números, mas muito mais que isso, ela carrega no seu fundamento a responsabilidade pela verdade daquilo que se propõe a expressar, para provocar no mundo relações mercadológicas de confiança, com transparência e com responsabilidade social e ambiental.

A Estrutura Conceitual para Relatório Financeiro, emitida pelo órgão normatizador das IFRSs (International Financial Reporting Standards), o IASB (International Accounting Standards Board), e adotada pelo CPC (Comitê de Pronunciamentos Contábeis), normatizador brasileiro, carrega como características qualitativas fundamentais para a confecção das Demonstrações Contábeis, a utilidade daquilo que se propõe a informar (Relevância), além da fidedignidade sobre aquilo que está sendo informado (CPC 00-R2, 2019). Essa utilidade está relacionada à capacidade da informação para servir à confecção de previsões e também como indicador de desempenho em comparações com os dados efetivamente realizados. Já a fidedignidade informativa está relacionada à completa representação daquilo que é necessário para se compreender a essência do fenômeno econômico apresentado. Essa representação do fenômeno não pode conter vieses ou inclinações (neutralidade) e deve expurgar qualquer possibilidade de imprecisão, tanto na exposição do fenômeno quanto na aplicação dos procedimentos técnicos escolhidos (livre de erros ou desvios). Vê-se portanto que, a Contabilidade está calcada em uma fundamentação que busca a integridade daquilo que se reporta, disponibilizando aos interessados (stakeholders) um terreno fértil de possibilidades para atuações sinceras e retas, o que gera valor pela credibilidade.

Em 2004, foi publicado o relatório Who Cares Wins, como resultado de uma iniciativa conjunta de 20 instituições financeiras, a convite do Secretário-geral das Nações Unidas, que objetivou traçar direcionamentos e recomendações para integrar questões de Governança Ambiental, Social e Corporativa (ESG – Environmental, Social and Corporate Governance) ao mercado financeiro, em busca de um mercado mais sustentável e com melhores retornos sociais (KNOEPFEL, 2004). O relatório desenvolvido tinha como base a crença de que o gerenciamento das questões ESG criam valor para as empresas que os consideram como parte da missão delas, elevando a reputação perante a sociedade, impactando positivamente a marca e assim aumentando a competitividade. O documento afirmava que a criação de valor estava associada ao melhor gerenciamento de risco e da qualidade, ambos fatores determinantes de sucesso das empresas. E um outro ponto considerado na publicação era que buscar um futuro de baixos níveis de consumo de carbono (CO2) impactaria  positivamente no sucesso dos negócios. Nesse momento, a questão do aquecimento global causado pela emissão de gases do efeito estufa já era consenso científico.

O Protocolo de Kyoto, assinado em 1997, no Japão, e aprovado em 1998, como resultado da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, a COP3 (Conference of the Parties 3), oficializou um acordo internacional para quantificar a limitação de emissões de gases geradores do efeito estufa para vários países, com o objetivo do desenvolvimento sustentável, e com vigência a partir de 2005 (UNFCCC, 1998). Vale mencionar que, o dióxido de carbono (CO2) foi pautado como um dos 6 gases com compromisso de redução de emissão entre as nações e, no artigo 12 do Protocolo foi definido o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), mais comumente chamado de mercado de Certificado de Crédito de Carbono (CER-Certified Emission Reductions). Esse mercado é movimentado pela compra de Certificados de Créditos de Carbono, representantes de 1 tonelada de CO2 cada, por aqueles países que têm dificuldades de atingir suas metas do Protocolo. Os países que vendem os Certificados são aqueles, cujas emissões ficaram abaixo do limite definido. O fundo gerado nestas negociações são destinados a projetos que contribuem com o objetivo de limitação da emissão destes gases. Como uma continuidade e revisão dos objetivos do Protocolo de Kyoto, mais tarde, em 2015, em Paris, na França, foi assinado e aprovado o Acordo de Paris, na COP21 (Conference of the Parties 21), com vigência a partir de 2020. Vê-se nas COPs a preocupação globalizada da aplicação de uma dinâmica sustentável no mercado econômico-financeiro, conduzindo a uma maior geração de qualidade sócio-ambiental.

Em 2021, durante a Conferência do Clima COP26 (Conference of the Parties 26), o Presidente da Fundação IFRS divulgou a formação do International Sustainability Standards Board (ISSB) ou Comitê de Padrões Internacionais de Sustentabilidade, além da consolidação, em 2022, de dois definidores de Padrão de Sustentabilidade Internacional: o Value Reporting Foundation (VRF, 2022), para a compreensão do Valor da empresa, abrigando o Integrated Reporting Framework (IRF) e os Padrões SASB (Sustainability Accounting Standards Board); e o Climate Disclosure Standards Board (CDSB, 2022). O intuito da criação do ISSB , que trabalhará em conjunto com o IASB, foi criar Padrões Globais de Divulgação de Sustentabilidade (IFRS Sustainability Disclosure Standards) para prover o mercado com informações de qualidade nesse tema. Isso possibilita que os investidores percebam como o mercado está lidando com as questões ESG (Environmental, Social and Corporate Governance), ajudando-os a entender melhor o valor associado às empresas nas quais decidirão investir. Isso mostra a tendência do mundo financeiro em uma convergência de regulação conjunta com as preocupações de sustentabilidade, gerando uma nova forma dos agentes atuarem no mercado.

Diante de todo o contexto abordado, percebe-se que os níveis de qualidade das informações divulgadas no mercado econômico-financeiro, tornam-se cada vez mais elevados, expressando os fenômenos econômicos em comunhão com a gestão do meio ambiente. A incursão da Fundação IFRS dentro de um abordagem normatizadora dos Padrões de Sustentabilidade completa um conjunto nobre de contribuições sociais deste órgão regulador de Contabilidade, ao englobar preocupações com o valor das empresas, com fidedignidade e relevância dos fatos, e com efeitos climáticos. Assim, entende-se que, o mundo está se tornando paulatinamente um palco, onde o controle Contábil coroa os agentes de mercado que atuam de maneira transparente e sustentável na condução dos seus negócios.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CDSB – Climate Disclosure Standards Board. 2022. Disponível em: https://www.cdsb.net. Acesso em: 27 mar. 2022.

KNOEPFEL, Ivo. Who Cares Wins. 2004. Disponível em: https://d306pr3pise04h.cloudfront.net/docs/issues_doc%2FFinancial_markets%2Fwho_cares_who_wins.pdf. Acesso em: 27 mar. 2022.

Pronunciamento Técnico CPC 00 (R2) – Estrutura Conceitual para Relatório Financeiro. Comitê de Pronunciamentos Contábeis, 2019. Disponível em: http://static.cpc.aatb.com.br/Documentos/573_CPC00(R2).pdf. Acesso em: 27 mar. 2022.

UNFCCC. Kyoto Protocol to the United Nations Framework Convention on Climate Change. United Nations, 1998. Disponível em: https://unfccc.int/resource/docs/convkp/kpeng.pdf. Acesso em: 27 mar. 2022.

VRF – Value Reporting Foundation. 2022. Disponível em: https://www.ifrs.org/sustainability/value-reporting-foundation/. Acesso em: 27 mar. 2022.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal.

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